Nesta segunda edição, apresentamos ao público um resumo da história da Rota da Seda e dos recentes desenvolvimentos da Iniciativa Cinturão e Rota, que completa 10 anos em 2023. Ademais, analisamos a estratégia chinesa a partir de determinadas áreas-chave e fazemos algumas recomendações para os governos do Brasil e da China, no que concerne à relação entre os dois países. Neste Guia, nosso intuito é esclarecer dúvidas, acabar com mitos e propor mais debates sobre a Nova Rota da Seda, fomentando pesquisas futuras sobre o tema e, acima de tudo, impulsionando discussões públicas sobre a China.
Em pleno funcionamento entre 130 a.C. e 1453 d.C., a Rota da Seda impactou imensamente o mundo. Com origem na China durante a dinastia Han, referido conjunto de rotas serviu para conectar a Ásia, o Oriente Médio e a Europa e, mais que isso, para acelerar o desenvolvimento de produtos e serviços, dinamizando trocas comerciais entre variados povos e influenciando as relações político-econômicas e socioculturais entre eles. Sem dúvida, teve um papel primordial na história de diversas sociedades, seja por ter disseminado artigos como seda, pólvora e papel, seja pelo fato de seu encerramento ter ensejado a época das grandes navegações europeias.
Séculos depois, em 2013, o presidente chinês Xi Jinping promoveu um verdadeiro resgate histórico e, de maneira ambiciosa, propôs a criação da Nova Rota da Seda, ou, oficialmente, do Cinturão Econômico da Rota da Seda e da Rota da Seda Marítima do Século XXI, que, juntos, configuram a Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês). De maneira similar à Rota da Seda original, a BRI, inicialmente, visava a promover a conectividade entre países asiáticos, europeus e africanos. Contudo, desde a Segunda Reunião Ministerial do Fórum China-CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), ficou claro que a América Latina passou a ser considerada uma extensão natural da Rota da Seda Marítima do Século XXI e participante indispensável na cooperação internacional da BRI (CELAC, 2018).
Indo além de uma expansão meramente geográfica, a Iniciativa Cinturão e Rota ganhou novos ares ao longo dos anos com o lançamento da Rota da Seda Digital, da Rota da Seda da Saúde, da Rota da Seda Verde e da Rota da Seda Polar. A partir de suas cinco prioridades – coordenação de políticas, conectividade de infraestrutura, comércio desimpedido, integração financeira e intercâmbio entre os povos – e de mecanismos bilaterais e multilaterais, a BRI tem a intenção de facilitar e de incentivar a cooperação ganha-ganha e o desenvolvimento comum, reforçando a compreensão mútua e a confiança entre os atores da sociedade internacional (República Popular da China, 2015).
De fato, segundo o documento “Visão e Ações na Construção Conjunta do Cinturão Econômico da Rota da Seda e da Rota da Seda Marítima do Século XXI” (República Popular da China, 2015), a iniciativa é guiada pelo “Espírito da Rota da Seda”, tendo como fundamentos primordiais a paz e a cooperação, a abertura e a inclusão, a aprendizagem mútua e o benefício mútuo. Com foco em questões relacionadas à infraestrutura, tanto tradicional (como portos, aeroportos e ferrovias) quanto nova (5G, big data e tecnologias verdes), ela tem o potencial de contribuir para a redução do gap de infraestrutura que existe no mundo inteiro. A correlação entre capacidade de infraestrutura e crescimento econômico não é nova (Banco Mundial, 1994), porém o déficit em investimentos nessa área permanece: somente no Brasil, estima-se que o país precise de investir R$3,7 trilhões nos próximos 10 anos (BNDES, 2023).
Considerando as potencialidades na iniciativa, até novembro de 2023, 148 países assinaram um Memorando de Entendimento com a China e juntaram-se à BRI: 44 na África Subsaariana, 35 na Europa e Ásia Central, 24 na Ásia Oriental e Pacífico, 21 na América Latina e Caribe, 18 no Oriente Médio e Norte da África, e seis no Sudeste Asiático (Nedopil, 2023). Além disso, de 2013 a 2022, a China investiu e realizou contratos com um total de aproximadamente 950 bilhões de dólares em países da BRI (Nedopil, 2023). Nesse contexto, e com base no documento “A Cooperação Internacional para o Desenvolvimento da China na Nova Era”, pode-se afirmar que o conceito de “comunidade de destino comum para a humanidade”, a prática da cooperação Sul-Sul e os objetivos constantes na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) são aspectos fundamentais para se compreender a BRI (República Popular da China, 2021).
Em 2023, a Nova Rota da Seda completa 10 anos de existência, e, como o documento “A Iniciativa Cinturão e Rota: Um Pilar-Chave da Comunidade Global de Destino Comum” (República Popular da China, 2023) e o “Terceiro Fórum do Cinturão e Rota para a Cooperação Internacional” dão a entender, a BRI continua sendo uma das principais estratégias de política externa chinesa. Dessa forma, é primordial que essa iniciativa seja não só desmistificada, mas também mais bem compreendida pela sociedade e pelo governo do Brasil (que ainda não é signatário), além do setor privado e das organizações sociais atuantes no país, a partir de olhares brasileiros que levam em consideração a historicidade chinesa e a crescente relevância do Sul Global nos debates associados às relações internacionais.
Leia a versão completa aqui.
Edited by
The opinions expressed in this article do not reflect the institutional position of Observa China 观中国 and are the sole responsibility of the author.
Subscribe to the bi-weekly newsletter to know everything about those who think and analyze today's China.
© 2024 Observa China 观中国. All rights reserved. Privacy Policy & Terms and Conditions of Use.